Arquitetura. Ensaio sobre a arte / Étienne-Louis Boullée

Aos homens que cultivam as artes

Dominado por um enorme amor pela minha arte, a ela me entreguei completamente. Ao me abandonar a essa paixão imperiosa, me impus a obrigação de trabalhar para merecer a estima pública por meio de esforços úteis à sociedade.

Desdenhei, confesso, limitar-me apenas ao estudo de nossos antigos mestres. Procurei aumentar, pelo estudo da natureza, minhas ideias sobre uma arte que, após profundas meditações, parece-me ainda estar em sua aurora.

Quão pouco, convenhamos, consagrou-se até nossos dias à poesia da arquitetura, meio seguro de multiplicar os prazeres dos homens e de dar aos artistas uma justa celebridade!

Acredito sim que nossos edifícios, sobretudo os edifícios públicos, deveriam ser, de algum modo, poemas. As imagens que eles oferecem a nossos sentidos deveriam despertar em nós sentimentos análogos ao uso para o qual esses edifícios são consagrados.

Pareceu-me que para pôr na arquitetura essa poesia encantadora à qual ela é susceptível, eu deveria investigar a teoria dos corpos, analisá-los, procurar reconhecer suas propriedades, sua força sobre nossos sentidos, sua analogia com nossa organização. Fico envaidecido de poder, remontando à fonte de onde as belas-artes emanam, daí retirar ideias novas e estabelecer princípios tão mais seguros quanto mais baseados na natureza. Ó vós que tendes paixão pelas belas-artes! Abandonai-vos sem reservas a todos os prazeres que pode nos proporcionar essa paixão sublime. Nenhum deles é tão puro. Sim, é essa paixão que nos dá o amor pelo estudo. É ela que transforma nossas penas em prazeres. É ela que, por meio de seu fogo divino, devolve ao gênio seus oráculos. É ela, enfim, que vos chama para a imortalidade.

A vós, que cultivais as artes, dedico esses frutos de minha vigília; a vós que, com conhecimentos extensos, fostes persuadidos, sem dúvida com razão, que não se deve presumir que nos resta apenas imitar os antigos! Julgais vós mesmos se eu antevi aquilo que, que eu saiba, nunca antes se tentou ver.

"Amigos iluminados das artes!
Se não pude alcançar o prêmio de tê-los agradado,
Ao menos tive a honra de começar a fazê-lo."
—La Fontaine

Étienne-Louis Boullée, Projeto cenotáfio de Newton, 1784. Image Cortesia de Bibliotèque nationale de France

Introdução

O que é a arquitetura? Defini-la-ia eu, como Vitrúvio, como a arte de construir? Não. Há nessa definição um erro grosseiro. Vitrúvio toma o efeito pela causa.

É preciso conceber para efetuar. Nossos primeiros pais construíram suas cabanas apenas após terem concebido sua imagem. É essa produção do espírito, é essa criação que constitui a arquitetura, que nós podemos, por conseguinte, definir como sendo a arte de produzir e de levar à perfeição todo e qualquer edifício. A arte de construir não é senão uma arte secundária, que nos parece conveniente denominar a parte científica da arquitetura.

A arte propriamente dita e a ciência, eis o que acreditamos ser necessário distinguir na arquitetura.

A maioria dos autores que escreveram sobre esse assunto se restringiu a tratar da parte científica. Isso pareceria natural graças ao pouco que se reflete a esse respeito. É preciso estudar os meios de construir solidamente antes de buscar construir agradavelmente. Sendo a parte científica uma necessidade primária e por conseguinte a mais essencial, os homens foram naturalmente determinados a dela se ocupar em primeiro lugar de modo particular.

É necessário, entretanto, concordar que as belezas da arte não são demonstradas como verdades matemáticas; e ainda que essas belezas emanem da natureza, para senti-las e delas fazer aplicações felizes, é preciso ser dotado das qualidades de que a natureza é avara.

O que vemos em todos os livros de arquitetura? As ruínas de antigos templos que nossos sábios desenterraram na Grécia. Por mais perfeitos que estejam, esses exemplos não são suficientes para substituir um tratado completo sobre a arte.

Lemos no comentarista de Vitrúvio todos os conhecimentos que um arquiteto deve reunir. Este, conforme o comentarista, deve ser universal. Lemos também no pomposo prefácio de François Blondel a descrição da excelência da arquitetura. Esse autor nos conta "que Deus para punir seu povo o ameaça de lhe tirar seus arquitetos". Ouvi homens divertidos exclamarem: é necessário estar entre os predestinados para ousar abraçar esse estado!

Leitor, vou surpreendê-lo ao afirmar que nesse pomposo prefácio, assim como no comentarista de Vitrúvio, apenas não percebo o que se deve entender por arquitetura. Acrescento que nem um nem outro desses dois autores tiveram alguma ideia dos princípios constitutivos de sua arte. Minha opinião poderá à primeira vista parecer revoltante, mas minha justificativa é fácil. O que enunciei, li num dos dois autores que acabei de citar.

É conhecida a famosa discussão que se travou entre Perrault, o autor do peristilo do Louvre, e François Blondel, o autor da porta Saint-Dennis. O primeiro negava que a arquitetura se baseasse na natureza; ele a denominava uma arte fantástica e de invenção pura. Procurando refutar essa opinião de Perrault, François Blondel utilizou argumentos tão fracos que a questão permaneceu sem resposta. Quando chegou minha vez de recolocá-la, não encontrei ninguém que tenha me respondido de modo satisfatório. Pelo contrário, vi homens instruídos abraçando a opinião de Perrault.

E agora, leitor, vos pergunto: não tenho razão, de algum modo, em afirmar que a arquitetura ainda está em sua infância, já que não se têm as noções corretas sobre os princípios dessa arte?

Concordo com todas as pessoas instruídas que, com tato e sensibilidade, pode-se produzir excelentes obras. Concordo que, sem estar familiarizado com os conhecimentos necessários para fazer a investigação dos princípios de sua arte até suas causas primeiras, os artistas, guiados por esse dom da natureza que nos conduz a realizar uma escolha feliz, sempre serão pessoas hábeis.

Mas não é menos verdadeiro que poucos autores consideraram a arquitetura sob os pontos de vista que pertencem à arte. Quero dizer que poucos autores procuraram aprofundar essa parte da arquitetura que denominei a arte propriamente dita. Se temos alguns preceitos fundados sobre bons exemplos, eles são poucos.

O comentarista de Vitrúvio nos diz que a arquitetura exige o conhecimento das ciências que têm relação com a geometria, como a mecânica, a hidráulica, a astronomia, em seguida com a física, com a medicina, etc. Ele termina por reclamar o conhecimento das belas-artes. Mas, observando que as ciências e as belas-artes têm relação com a arquitetura considerada como arte, já que, aliás, Perrault qualifica suas produções de fantasias; que François Blondel, em sua refutação, não conseguiu provar o contrário; e que ninguém até o momento pôde prová-lo, chega-se a desvelar a existência e a fonte dos princípios sobre os quais se funda a arte da arquitetura, pode-se, creio eu, sem ser temerário, concluir que tais princípios permaneceram ignorados, ou pelo menos não foram desenvolvidos por aqueles que puderam conhecê-los.

Encontrei pessoas hábeis que me objetaram que a elevada discussão entre Perrault e François Blondel degenerou em disputa, com o calor e o espírito partidário se apoderando deles, nada poder-se-ia concluir sobre o que eles tinham pronunciado na ocasião e que, com certeza, Perrault pensava de modo diverso do que ele tinha dado a entender. Ora, um dos que assim falavam reconhecia entretanto que a questão era difícil de resolver. Eu o ouvi ler na Academia uma memória na qual essa questão era levantada, embora estivesse longe de ser encerrada.

Ao considerar em conjunto com os arquitetos o peristilo do Louvre, pude apreender o momento em que eles admiravam as belezas para simular um sentimento totalmente oposto. Percebe-se facilmente que eles exigiam que eu me explicasse. Então lhes lembrei a opinião de Perrault. Admirem esta obra, lhes dizia eu; mas o próprio autor admite que esta obra é pura fantasia e que ela nada tem a ver com a natureza. Vossa admiração é, portanto, o resultado de uma opinião particular, e não deveis vos surpreender por ouvir suas críticas, já que as pretensas belezas que vós destacais não têm nenhuma relação com a natureza de onde o verdadeiro belo emana. Podeis, acrescento, admirar os meios empregados na construção desse edifício; eu concordaria convosco que ele é obra do saber e até do gênio; mas, conforme a confissão do autor, creio que, quando admirais aquilo que chamais as belezas da arquitetura, vossa admiração provém apenas de um costume de ver, sem que exista em tudo que destacais uma beleza real. Meus colegas não me respondiam senão balbuciando, ou melhor, eles não me contestaram e isso não me surpreende. Quando não se refletiu profundamente a respeito não é fácil, considerando as belezas do peristilo do Louvre ou de qualquer outro monumento, poder explicar em que consistem suas relações com a natureza. O que me espanta é que não se busque esclarecer uma questão dessa importância.

Quais são, pois, as razões que impediram os progressos da arquitetura na parte que temos denominado a arte propriamente dita? Elas me parecem muito simples.

Não basta para a perfeição de uma arte que os homens que a ela se dedicam a amem apaixonadamente. É preciso ainda que não encontrem nenhum entrave nos estudos que lhes importa fazer, que seu gênio possa se elevar livremente a toda sua altura e que eles sejam encorajados pela esperança de receber o prêmio por seus esforços.

Suponhamos agora que alguns progressos comecem a estabelecer a reputação de um jovem arquiteto e a lhe obter a confiança do público. Sobrecarregado então por inúmeras demandas e detalhes de toda espécie, forçado a se dedicar aos negócios que lhes são confiados, continuamente ocupado em fazer as tarefas que solicita a confiança que se lhe atribui, convertido, numa palavra, no homem de negócios do público, o artista é afastado dos progressos da arte e, por conseguinte, não pode aspirar à verdadeira glória à qual ele teria podido pretender; não podendo a ela consagrar todos os momentos necessários, ele se encontra forçado a abandonar o estudo de sua arte.

Quer dizer que seria conveniente, para seguir os estudos puramente especulativos, que o arquiteto abandonasse os negócios lucrativos? Ai! Quem é aquele que faria voluntariamente o sacrifício da fortuna que se lhe apresenta, e até mesmo do que lhe é necessário? Acrescentar-se-á que esse sacrifício será compensado pela esperança de um dia ser encarregado de alguns grandes monumentos? Mas como se entregar a essa esperança? As oportunidades são tão raras! Como se gabar, dez anos antes, que seguramente se estará empregado pelos homens que, então, ali estarão? Responderão, talvez, que o homem de mérito tem o direito de esperar por isso. E eu replicaria: esta justiça lhe será feita? Tem ele razão de esperar se ver preferido? Suponho que aqueles que demandam obras têm a visão correta, as intenções mais puras, e me vejo ainda forçado a convir que, por falta de conhecimentos, eles agem frequentemente às cegas e que é um feliz acaso quando a escolha recai sobre um homem hábil. Quantas vezes sua preferência não foi de acordo com manipulações ignorantes em detrimento do homem de mérito que sempre trabalha e nunca faz intrigas!

Oh! Quanto é preferível a sorte dos pintores e dos literatos! Sem nenhuma espécie de dependência, eles podem escolher todos os seus temas e seguir o impulso de seu gênio. É apenas deles que sua reputação depende. Têm eles talentos eminentes? Nenhuma força humana pode impedir que eles os desenvolvam. Que eles se distingam como esses grandes homens que provocam nossa admiração; que como Lucrécio, através de expressões inebriantes, versem em nossos corações as delícias da volúpia, ou então podendo dizer, assim como Correggio: "E também sou pintor! ", eles encantem nossas almas pelas graças exaladas em seus inimitáveis quadros; que se elevando à altura do gênio de Rafael, oferecendo a nossos olhares a imagem sublime do Criador desvendando o caos, eles mantenham em suspenso todas as faculdades de nossa alma; enfim, à maneira das imortais estátuas da Grécia, eles nos ofereçam divindades pela reunião das majestosas belezas da espécie humana. Que eles venham a fazer uma feliz colheita no vasto campo que a natureza lhes deixa à disposição, e seus nomes passem com brilho à posteridade, assegurando para si mesmos uma felicidade pura; e cada um deles se encontre autorizado a dizer: "Eu não devo senão a mim toda a minha notoriedade".

Eis as alegrias inexprimíveis e as preciosas vantagens das quais é privado o jovem arquiteto cujos talentos permaneceriam encobertos se ele dedicasse todo o seu tempo ao estudo. Ele é obrigado a se sacrificar para vir a ser conhecido pelas pessoas do lugar, de cuja benevolência depende para desenvolver seus talentos.

Étienne-Louis Boullée, Projeto de igreja metropolitana (Métropole) 1781-1782. Image Cortesia de Bibliotèque nationale de France

Está aí, sem dúvida, uma fonte abundante de dores agudas e saudades amargas para aquele que tem paixão pela sua arte; também não me surpreendeu quando ouvi dizer que, por ter provado as privações de que falei, um homem muito hábil se entregou ao mais atroz desespero. Tampouco estranhei que certos arquitetos me considerassem exagerado, mas creio poder afirmar que esses homens não teriam de um arquiteto senão o nome e saberiam reconhecer a felicidade apenas nas riquezas.

Entretanto, admitamos por um instante que minhas opiniões, sob certos pontos de vista, sejam falsas. Atribuamos a um arquiteto a mais favorável sorte, isto é, talentos, fortuna e mecenas. Aonde poderão levá-lo essas vantagens tão difíceis de encontrar reunidas?

Sabe-se que quando o particular mais simples constrói, ele põe à prova a paciência de seu arquiteto, cujas decisões é raro que ele acolha. Sabe-se também que as autoridades que ordenam a construção de monumentos públicos não são em geral mais dóceis que os particulares. A que se chega então? Que, para obedecer às ordens superiores, o arquiteto se vê diante da necessidade de renunciar a belas ideias. Há mais: supondo-se esse arquiteto um homem muito hábil, seus projetos serão tão menos acolhidos quanto seus juízes; não tendo as luzes, não poderão nem atingir nem apreciar as belezas de suas produções.

Sim, por não ser compreendido, o hábil arquiteto provará mil contrariedades desencorajadoras e, se ele quiser ser mantido, evitará opor resistência; ele não mais ouvirá a voz de sua alma, ele descerá ao nível das pessoas às quais tem necessidade de agradar. Sabendo que esta flexibilidade é difícil de encontrar no homem superior e como se demonstrou que muito frequentemente em arquitetura é permitido se sujeitar a alma, vê-se, por conseguinte, que é também muito difícil que um arquiteto hábil possa produzir uma boa obra.

Que não se espere encontrar a oportunidade de desenvolver um gênio verdadeiramente superior na construção de algum desses edifícios públicos, que deveriam sempre fazer a glória do país onde eles são erguidos e a admiração dos conhecedores. Caso se chegue a ser escolhido para iniciar um, conseguir-se-á acabá-lo? Que exemplo desolador atinge nossos olhos no seio de nossa cidade capital! Há quantos séculos o Palácio do Louvre foi iniciado? Que se considere a fachada das Tulherias para o jardim; que rapsódia ela apresenta? A fachada do corpo central é de mãos diferentes cujos modos particulares se distinguem facilmente. Os fundos, assim como os pavilhões das esquinas, também são de autores diversos. Esse palácio pode, assim me parece, ser comparado a um poema para o qual diferentes poetas teriam feito cada um uma estrofe.

Mas vão me dizer, malgrado tudo isso que se opõe ao avanço de vossa arte, não temos obras-primas que constatem todas as belezas e manifestem a perfeição? Verão minha opinião a esse respeito. Esperando que eu a enuncie, diria apenas que, se a arquitetura tivesse atingido a perfeição alcançada por outras artes e nos oferecido exemplos tão belos quanto aqueles que elas nos oferecem, não estaríamos hoje constrangidos a indagar se essa arte pertence à natureza ou se ela é pura invenção. Certamente, posso adiantar, sem acreditar chocar alguém, que nós temos aparentemente necessidade de demonstração a esse respeito, já que o autor do peristilo do Louvre não pôde ver nos monumentos conhecidos senão produções fantásticas. Não saberia como evitar me apressar em reconhecer que creio ver uma grande diferença entre as obras-primas de arquitetura e aquelas que excitam nossa admiração, seja na pintura, na escultura ou na poesia. Isso é uma conseqüência das observações que fiz anteriormente sobre as vantagens do poeta e do pintor.

Esses últimos não foram incomodados na escolha de suas temáticas; esgotaram todos os temas enquanto que, por toda a Europa, contamos com dificuldades alguns belos monumentos de arquitetura. De modo que quando se queria assegurar que nossas obras-primas de arquitetura pudessem igualar às das outras artes, que prova se poderia dar? Seguramente não se tem tantos objetos de comparação em arquitetura, e não se pode ter a medida do sucesso numa arte senão pela multiplicidade das tentativas de todo gênero.

Este assunto me lembra uma conversa bastante singular. Estava eu no campo com um amador e um jovem pintor. Caminhando juntos, nos entretínhamos com a pintura; eu comentava com o amador um dos mais belos quadros de Wouwermans que tínhamos visto anteriormente. Como esse quadro me tinha provocado um prazer extremo, eu o elogiava de modo apaixonado. O amador permanecia frio. Ninguém é mais exigente que um homem que, não sendo versado numa arte, não imaginando todas as dificuldades que é preciso aí superar, não tem piedade do artista e acredita que tudo é possível. Esse amador, fazendo-me considerar a natureza, me diz ironicamente: "Quantas coisas esquecidas por Wouwermans!" Eu me apressei em lhe responder: "Opondo a natureza às obras de Wouwermans, vós concedeis a esse célebre mestre uma homenagem maior que pensais; acreditais que as obras dos fracos mortais possam sustentar a comparação que vós me ofereceis?" "Como! aproximar-se da obra da divindade! (...) a Divindade!, grita o jovem pintor; ah! que ela queira descer sobre a terra e se digne rebaixar-se até empregar apenas os meios aos quais estamos reduzidos, e vós tereis, Senhor, uma ideia justa de nossos grandes homens." Através do delírio desse jovem, não podemos mais deixar de reconhecer essa verdade! É que, supondo que não tivéssemos conhecimento algum dos meios com os quais os pintores trabalham, e que nunca tivéssemos visto pintar, se após nos ter mostrado um quadro qualquer, do qual a verdade impressiona, se nos oferecesse uma paleta, não poderíamos acreditar que fosse possível fazer, com tão poucos meios, coisas que produzem sobre nossos sentidos as mais vivas impressões. Como imaginar que com cinco ou seis cores diferentes se possa obter a imensidade de tonalidades e nuances e todos os efeitos da natureza? Como é possível que o homem tenha conseguido fornecer o calor ou o frescor do ar e produzir a luz; que haja chegado a caracterizar por meio do desenho as paixões que nos agitam, a ponto de fazê-las entrar em nossa alma, mostrando-as vivas sobre a tela?

Talvez se argumente que se os artistas em arquitetura não adquiriram o alto grau de perfeição o qual, parece, as outras artes atingiram é que essas, tendo a vantagem de estar mais perto da natureza, elas são por conseguinte mais adequadas a agir sobre nossa alma.

A isso eu respondo que está aí precisamente a questão que eu tentei resolver; que eu entendo por "arte" tudo o que tem por objeto a imitação da natureza; que nenhum autor em arquitetura empreendeu a tarefa que me impus; e que se eu chegar, como ouso acreditar, a demonstrar que a arquitetura, em suas relações com a natureza, tem talvez ainda mais vantagem que as outras artes, será preciso necessariamente concordar comigo que, se a arte da arquitetura não fez tanto progresso quanto as outras artes, não se deve atribuir senão aos arquitetos, que eu creio, entretanto, desculpáveis, conforme a enumeração que fiz dos entraves que foram e ainda são colocados à perfeição da arquitetura. A Deus não agrada que eu tenha concebido o projeto de ofender os distintos arquitetos de meu século; eu os respeito e os amo. E de acordo com a elevada opinião que tenho de seu caráter, estou convencido de que eles entenderão, sem desgosto, a linguagem de um homem que tem por fim apenas concorrer aos progressos de sua arte. Se me engano, minhas opiniões farão mal apenas às minhas luzes; e não dever-se-á suspeitar de minhas más intenções. Se, pelo contrário, eu apontei algumas verdades, oh! com certeza, eu não desgostaria aos homens distintos de quem a verdade sempre obtém respeito e amor.

Étienne-Louis Boullée, Projeto da Biblioteca Nacional, 1975. Image Cortesia de Bibliotèque nationale de France

Referências:
Étienne-Louis Boullée, Architecture. Essai sur l'art, (1770-1784), Ed. Hermann, París, 1968, 1ª ed.
Étienne-Louis Boullée, L'architecte visionnaire et néoclassique (textes réunis et présentés par J. M. Pérouse de Montclos), Ed. Hermann, Paris, 1993.
Bibliothèque nationale de France, exposição Étienne-Louis Boullée.

Fonte:
Revista Risco, n. 2, 2005, pp.98-104.

Sobre este autor
Cita: Igor Fracalossi. "Arquitetura. Ensaio sobre a arte / Étienne-Louis Boullée" 06 Dez 2013. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/01-158245/arquitetura-ensaio-sobre-a-arte-slash-etienne-louis-boullee> ISSN 0719-8906

¡Você seguiu sua primeira conta!

Você sabia?

Agora você receberá atualizações das contas que você segue! Siga seus autores, escritórios, usuários favoritos e personalize seu stream.